Permacultura: revolução silenciosa acontecendo AGORA

Entre os meus contemporâneos e jovens que vejo buscando uma causa para lutar, muitos escolheram diminuir o ritmo da vida, "ser a mudança que querem ver no mundo", agir localmente para mudar globalmente, optando, por exemplo, por se alimentar melhor e aderindo a movimentos como "slow food" e andar de bicicleta. Um outro grupo no qual eu me incluo tem ainda saído das grandes cidades com a proposta de viver mais simples e plantar sua própria comida.

Conheça a  seguir a permacultura, que eu tenho chamado de uma nova revolução, silenciosa e prática. 

A matéria a seguir, de minha autoria,  foi publicada na Revista Planeta do mês de junho.

Adicionei aqui no blog umas fotos que não constam na publicação original.

Imagem: Símbolo da permacultura. Autoria de Bill Mollison e Permaculture Institute. A serpente que morde o próprio rabo é uma imagem presente em diversas culturas ancestrais. Representa a roda da vida, o ritmo presente na natureza, os ciclos de nascimento e morte. Em última instância, pode ser interpretada também como a roda da história, e a lei da ação e reação: tudo aquilo que cada um faz retorna para si mesmo de alguma forma.


Imagine uma volta ao passado. 

Há 25 anos, não se usava celular, internet ou computadores domésticos. Volte mais três gerações e o uso de petróleo e de energia elétrica para mover as indústrias ainda estava engatinhando. Embora já existissem grandes cidades, a maior parte da população ainda vivia de forma simples, produzindo com as mãos aquilo que era necessário para sobreviver ou fazendo trocas de produtos e serviços em sua própria região.
Podemos viajar no tempo por seis mil anos e observar a cultura humana em relação direta com os recursos naturais. Comunidades tradicionais, lavradores, fazendeiros, indígenas e quilombolas viviam da terra e produziam, localmente, os bens de que necessitavam. Foi esse tipo de ocupação do planeta que gerou a diversidade de alimentos, as formas de moradia e as tecnologias sociais que integram o panorama das diferentes culturas.
Há pouco tempo as pessoas passaram a comprar ou importar de lugares distantes a maior parte do que consomem. Globalização, shoppings, compras por internet e sonhos de consumo são invenções recentes que existem a menos de 1% da linha do tempo do homem e sua cultura.

Algumas tecnologias ecológicas de diversas tradições das quais se utilizam os permacultores. Fotos de Simara Sousa, tiradas no Sete Ecos.  
Paredes de bambu-a-pique e bambu tratado; telhado de garrafas pet 

Bacia de captação em águas pluviais: retém água no alto da propriedade contribuindo para segurar umidade no terreno. Aumentando-se a infiltração no solo, evita-se a erosão e a enxurrada. As águas dessa bacia propiciam a irrigação dos cultivos, mesmo 3 meses após o início do período de seca.



Respeito ao passado

Na década de 1970, os pesquisadores australianos Bill Mollison e David Holmgrem inventaram a permacultura, de olho no resgate dos saberes ancestrais e dos modos tradicionais de vida e relacionamento com a terra. O conceito surgiu com a fusão das palavras “cultura” e “permanência”. Hoje, o movimento da permacultura conta com milhares de adeptos, a maior parte vivendo em ecovilas, sítios ou redes urbanas solidárias, empenhados em criar sistemas de produção integrados em todas as fases. Eles apostam na resiliência, na autonomia dos produtores e no aproveitamento total de energia gerada por meio da transformação de resíduos em insumos. Só no Brasil já há mais de 100 ecovilas em operação.
Para os permacultores, a humanidade perdeu sua independência na luta pela sobrevivência, o que induziu a multiplicação de cidades intrinsecamente desequilibradas. Acostumados a ter tudo pronto, os homens não são mais capazes de sobreviver a longos períodos de escassez ou a crises mundiais, em que a distribuição de alimentos, por exemplo, seja comprometida. Nem prescindir de redes externas de fornecimento de energia, de água, de esgotos ou de comunicação.
“Desde que a vida existe neste planeta, uma das características dos seres vivos foi a de saber se alimentar. Mas o homem perdeu a capacidade ou a responsabilidade de satisfazer suas necessidades básicas”, ressalta o argentino Jorge Timmermann, um dos precursores do movimento no Brasil, dono da Estação de Permacultura Yvy Porã, em São Pedro de Alcântara (SC).
“É mais fácil delegar a alguns experts, aos especialistas do momento, a nossa alimentação, a destinação de nossos dejetos, a produção e a provisão de água potável, a resolução dos problemas de emissão de poluentes inerentes à indústria e à atividade econômica, assim como a produção e distribuição de energia”, enumera o permacultor que há nove anos, junto com a mulher, Suzana Maringoni, experimenta sistemas independentes e autossustentáveis em Yvy Porã. “Costumo dizer que antes da permacultura eu era um tremendo ecochato. Andávamos pelo mundo dizendo o que não podia ser feito, mas não sabíamos com certeza o que e como fazer”, define Timmermann.

Jorge e Suzana em sua casa pernacultural. Essas paredes são de cordwood, uma técnica de bioconstrução..

O caráter essencialmente prático do movimento funciona como ímã. Hoje a permacultura conta com mais de 10 mil praticantes em todos os continentes e 220 professores trabalhando em tempo integral. Nesse momento, há permacultores viajando por diversas cidades e países para ministrar cursos.
Cofundador do Movimento Brasileiro de Ecovilas, o médico naturalista Márcio Bontempo, um dos animadores da Ecovila da Montanha, em Alto Paraíso (Goiás), afirma que o Brasil é um dos países onde o movimento tem mais adeptos. “Há muitas ecovilas nas Chapadas dos Veadeiros e na Chapada dos Guimarães, no Centro-Oeste, além das comunidades de base religiosa, bem-sucedidas na produção sustentável de alimentos. O movimento é mais forte no Brasil do que nos Estados Unidos, mas menos difundido do que na Austrália e na Tasmânia, onde nasceu. O desafio é tornar as experiências visíveis, além de fortalecê-las e integrá-las, pois muitas ficam presas à realidade local e não se articulam, como ocorre no restante do mundo.” Bontempo quer construir um mapa de iniciativas permaculturistas no Brasil. Redes globais como a Global Ecovillage Network já fazem isso,  rastreando nos continentes as iniciativas que desenvolvem o conceito.

Conheça os princípios da permacultura e como ela propõe criar sistemas permanentes e sustentáveis, na continuação da matéria. Clique aqui.


Um comentário:

Antonioni Melo disse...

Excelente texto, referencia de objetividade. Gosto muito e confio no Marcio Bomtempo.